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A verdade sobre os preços de medicamentos: como a regulação não
impede valores abusivos
Regulação do preço dos medicamentos no Brasil abre brecha para
que grandes redes pratiquem valores no teto e usem desconto para coagir
consumidor a fornecer o CPF
Você já notou que um mesmo medicamento pode ser vendido a preços
muito diferentes no mesmo bairro ou cidade? Muitas vezes, apenas cedendo o CPF,
o preço cai significativamente. Isso ocorre devido à ausência de um preço fixo
para os medicamentos no Brasil. Na legislação atual, a Câmara de Regulação do
Mercado de Medicamentos (Cmed) estabelece apenas o preço máximo para cada
medicamento, geralmente muito acima do seu valor real.
Por exemplo, o medicamento Dolutegravir Sódico, utilizado no
tratamento da infecção pelo HIV, no ano passado custou R$ 123 em compras
públicas do governo federal. No entanto, de acordo com a tabela da Cmed, ele
pode ser vendido por até R$ 1.274,76. Isso significa que as grandes redes de farmácias,
que também compram do fornecedor em grande escala, têm liberdade para praticar
preços variados e até mesmo aumentar drasticamente o valor da caixa de um dia
para o outro, sem infringir a lei.
Segundo Marina Magalhães, analista do Programa de Saúde do
Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a Cmed, ao estabelecer
preços máximos muito acima da média do mercado, cria uma situação em que
qualquer valor abaixo desse limite é considerado aceitável.
"A Cmed acaba estabelecendo preços muito superiores à média
do mercado. Eles jogam os preços significativamente superiores aos custos de
produção", observa ela, destacando que, por vezes, “o valor [da Cmed]
chega a ser nove vezes maior do que a média”.
Os estudos do Idec indicam que cada reajuste anual anunciado
pela Câmara, aliado às falhas na determinação dos preços-teto, traz outro
problema: a proibição de reajustes negativos. Isso implica que, mesmo em um
cenário de desaceleração do mercado ou deflação, os preços sempre serão
elevados.
“Enquanto isso, as farmácias aproveitam essa margem elevada para
praticar valores que, embora considerados abusivos pelo consumidor, são
permitidos pela regulamentação”, acrescenta Marina.
Remédio
a preço justo?
Essa regulação coloca os consumidores, especialmente aqueles que
dependem de tratamentos contínuos, em uma situação muito desfavorável, criando
um aspecto alarmante do mercado farmacêutico: nunca sabemos verdadeiramente o
valor real daquele produto diante de uma variação de preços tão significativa,
sem uma justificativa clara para o consumidor.
Além disso, mesmo em farmácias da mesma rede, fatores como
comprar online, pessoalmente ou fornecer o número do CPF para obter um desconto
podem influenciar no valor final pago. O preço que pagamos na farmácia é
determinado pelos descontos supostamente aplicados pelas empresas,
possibilitando que os valores variem consideravelmente, ainda dentro dos
limites da lei.
"A hipótese do Idec é que as farmácias propositalmente
colocam o preço no teto da regulação para coagir o consumidor a fornecer o CPF
para um desconto que, na verdade, é artificial", afirma a analista.
Por exemplo, verificamos que o Cetoprofeno, medicamento
anti-inflamatório, possui um preço máximo para o consumidor de R$ 50,76,
conforme estabelecido pela tabela da Cmed. Contudo, ao compararmos os preços em
diferentes farmácias, observamos variações significativas. Na Paguemenos, por
exemplo, o valor é de R$ 45,92, mas com o desconto do CPF, o preço cai para R$
21,45, mais de 50% de abatimento. Na DrogaRaia, o preço com desconto é de R$
31,39. Já na Drogaria São Paulo, ao fornecer o CPF, o preço inicial de R$ 47,03
é reduzido para R$ 17,19.