divulgação (Foto: Reprodução // Agência Brasil )
CPI da Covid tem reta final com feridas abertas, acordo rompido e
divergências em relatório
No momento decisivo da CPI da Covid, o grupo majoritário que comanda as ações do
colegiado precisou enfrentar mais uma crise interna que colocou em risco a
unidade para aprovar o relatório final do senador Renan Calheiros (MDB-AL).
A atuação de bombeiros e acordos para promover ajustes no relatório
ajudaram a contornar momentaneamente o problema. O clima de tensão e disputas,
no entanto, seguem nos bastidores, inclusive com a ameaça de defecções na
votação do documento final da comissão, nesta terça-feira (26).
Na última quarta-feira (20), Renan leu o relatório final em uma sessão da comissão
marcada por emoção e discursos de impacto. Foram ressaltados o caráter
histórico da CPI e houve muitas promessas de justiça. Renan e o presidente Omar
Aziz (PSD-AM) trocaram uma série de elogios.
O clima contrastava com os momentos que precederam a sessão. O chamado
G7 havia mergulhado em uma grave crise por causa de divergências sobre o
relatório e pelo seu vazamento.
Os integrantes do grupo apontam que havia um acordo para que Renan se
reunisse individualmente com os senadores para discutir pontos do relatório.
Ainda na semana anterior à leitura do relatório, em uma reunião virtual
na sexta-feira (15), os senadores deixaram claro que havia discordância sobre
propor o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por genocídio
da população indígena.
O relator escutou a demanda por mais debate a respeito do assunto e
prometeu discutir o tema. Mais tarde no mesmo dia, porém, senadores explodiram
em revolta ao lerem na imprensa os pri ncipais trechos do relatório final, que
continha a tipificação de genocídio.
Embora a reação tivesse sido geral, deixando Renan isolado, as
expressões de descontentamento mais fortes partiram justamente de Aziz.
"É de conhecimento dele [Renan]. Ele não vazou esse relatório sem
saber que a gente queria discutir essa questão. Então, se você me perguntar se
está tudo bem, não, não está tudo bem", afirmou o presidente da CPI.
"Ia haver divergência? Ia. Mas [a gente chegaria] unificado. E não
a imposição de um relatório achando que alguém é dono da verdade a essa altura
do campeonato", disse o senador.
Os membros do grupo majoritário afirmaram que por trás da reação a Renan
estava um sentimento de traição, ciúmes, discordâncias técnicas e mesmo feridas
antigas abertas.
Os senadores acusaram Renan de buscar protagonismo no momento decisivo
da CPI da Covid. Aziz e Otto Alencar (PSD-BA) foram as principais vozes
críticas ao relator no grupo de WhatsApp dos membros.
Em relação a Aziz, não foi o primeiro ponto de atrito com o relator. O
presidente da CPI disse a colegas que ainda "não engoliu" o episódio
do pedido de prisão do ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten.
Aziz achava estar claro que havia um acordo de não determinar a medida
contra o ex-secretário, mas foi surpreendido com o pedido de prisão de Renan,
ato que rapidamente inflamou outros senadores. Ao presidente caiu o ônus de
negar a prisão.
Outro ponto de discordância foi quando Renan tomou o lado do senador
Eduardo Braga (MDB-AM), amazonense como Aziz.
O presidente da CPI exigiu apoio para aprovar requerimentos de quebras
de sigilo e convocações de adversários políticos no Amazonas, sendo alguns
deles aliados próximos de Braga.
Renan resistiu, e Aziz reagiu não pautando nenhum requerimento do
alagoano na sessão seguinte da comissão. A relação entre os dois foi
restabelecida, mas ainda com fissuras.
O relatório final da CPI da Covid do Senado
A questão específica do genocídio enfrentava uma dupla resistência.
Juridicamente, alguns membros afirmaram que não havia elementos para usar a
tipificação. Além disso, Aziz tinha resistência política.
No Amazonas, a defesa de questões indígenas significa desagradar o
importante eleitorado evangélico, fundamental na eleição local.
Em meio à crise, o senador Humberto Costa (PT-PE) e o vice-presidente Randolfe Rodrigues (Rede-AP) entraram
em campo para tentar reaproximar Aziz e Renan. Reuniram-se com o presidente da
CPI e ouviram que ele não "queria papo" com o relator.
Tasso Jereissati (PSDB-CE) também se posicionou para buscar uma solução.
Promoveu no dia anterior à leitura do relatório, terça-feira (19), uma reunião
em sua casa para acertar os ponteiros do relatório, marcada por bate-bocas e
discussões ríspidas entre os congressistas.
A polêmica questão do genocídio contra indígenas, tema central das
trocas de acusações públicas, acabou resolvida na reunião sem grandes
problemas.
Costa levou uma cópia do Tratado de Roma, que instituiu o Tribunal Penal
Internacional, para argumentar que não seria possível enquadrar as ações e
omissões de Bolsonaro referentes aos indígenas.
Ainda segundo relatos de participantes, Braga deixou claro ao colega de
partido, Renan, que ficara insatisfeito com o teor do parecer.
Além de discordar do pedido de indiciamento do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) por advocacia
administrativa, entre outros pontos, o que mais irritou o senador foi a
ausência do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), e ex-secretários de
Saúde do estado.
O senador do Amazonas elaborou um adendo ao relatório de Renan propondo
novos indiciamentos. Se os pedidos não forem acatados, Braga admitiu a pessoas
próximas que pode apresentar um voto em separado, isto é, um relatório
alternativo ao do correligionário.
Segundo aliados, o amazonense ficou bastante chateado com Renan, até
porque partiu dele próprio a indicação do nome do alagoano para ser o relator
da CPI.
No início da semana, Renan foi chamado de traidor e exibicionista.
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O grupo majoritário conta com 7 das 11 vagas titulares na CPI. O
relatório precisa ser aprovado por maioria simples dos membros participantes da
sessão.
Em outro momento tensão da reunião, Renan foi cobrado pelo vazamento do
relatório. Aziz disse exaltado para o relator que ele teria vazado o documento
para aparecer mais que os colegas.
Outros membros então tentaram colocar panos quentes. Mais para a frente,
Renan explicava um ponto do texto e disse que o relatório teria vazado,
sinalizando que a ação não partiu dele. Puxados por Aziz, todos explodiram em
uma sonora gargalhada.
Na hora da descontração, porém, em um jantar em que foi servido peixe e
arroz de pato, Aziz já não estava mais presente.
Após a apresentação do relatório, além de Braga, outros senadores
começaram a pressionar Renan para a inclusão de novos nomes na lista de
indiciamentos.
Muitos senadores afirmam ser bem possível a realização de novas
negociações em bastidores e jantares, para que na sessão de terça-feira (26)
todos possam voltar a trocar elogios públicos.
PRÓXIMOS PASSOS DA CPI
Previsão de votação do texto Terça (26)
Principais divergências
Um dos pontos, como relatou a coluna Mônica Bergamo, da Folha, é a
proposta de indiciamento de Bolsonaro pelo crime de genocídio contra a
população indígena.
Os membros do G7, como é conhecido o grupo majoritário da comissão,
também divergem sobre a inclusão de membros da família do presidente Bolsonaro
entre as propostas de indiciamento
O QUE ACONTECE APÓS A VOTAÇÃO DO RELATÓRIO
A CPI ainda tem algum poder após a apresentação o relatório final? Não,
pois a aprovação e o encaminhamento do relatório constituem a etapa final da
CPI.
Como estratégia para acompanhar os desdobramentos das investigações da
comissão, os senadores Omar Aziz (PSD-AM), que preside a CPI, e o
vice-presidente, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), apresentaram a proposta de criação
de um grupo permanente, a Frente Parlamentar Observatório da Pandemia.
A iniciativa, porém, depende de aprovação no Senado
A quem o relatório é enviado? Cada uma das conclusões do relatório pode
implicar no envio para órgãos distintos. No caso de ilícitos criminais ou
civis, por exemplo, a competência para denunciar formalmente os investigados
pela CPI ou de requerer mais investigações é do Ministério Público.
No caso de autoridades com foro, caso do presidente, esse papel é
desempenhado pela Procuradoria-Geral da República (PGR).