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Projeto de Angelo Coronel quer liquidar
dívida de produtores de cacau da Bahia
Senador defende que cacauicultores prejudicados pela praga
conhecida como vassoura-de-bruxa sejam socorridos para depois gerar mais
impostos ao governo
O senador Angelo Coronel (PSD-BA) apresentou, no fim de
fevereiro, o Projeto de Lei (PL) 479/2024 que institui o Novo Programa de
Reestruturação da Região Cacaueira da Bahia. Denominado 'Renova Cacau', o PL
extingue as dívidas dos produtores de cacau no estado. O texto está em
tramitação e deve ser terminativo nas comissões - ou seja, se aprovado nos colegiados,
não precisa ir a plenário.
De acordo com o senador baiano, os débitos giram entre R$ 33,6
milhões e R$ 87 milhões, e ocorrem porque os produtores pegaram empréstimos com
o objetivo de combater a doença conhecida como vassoura-de-bruxa, que atacou as
lavouras da região nos anos 1980.
"O projeto é terminativo nas comissões, por isso é um
trâmite bem rápido. Nosso objetivo com isso é fazer justiça, pois quando a
vassoura-de-bruxa foi introduzida em 1985, aproximadamente, foi um ato
criminoso para tirar a Bahia da liderança nacional da produção do melhor cacau
do mundo. Hoje, em qualquer lugar do mundo, é sabido que o cacau da Bahia é o
que proporciona o melhor chocolate", afirmou o senador.
Segundo Coronel, dívidas de produtores giram
entre R$ 33,6 milhões e R$ 87 milhões
Na justificativa do projeto, Coronel lembrou que foi lançado um programa
de recuperação da lavoura, mas, segundo ele, as escolhas técnicas e
tecnológicas oferecidas pelos órgãos técnicos da época não resolveram o
problema e provocaram enorme endividamento dos produtores.
"Foi criado um programa de recuperação da lavoura, que, ao
invés de recuperar, prejudicou. Porque a vassoura-de-bruxa atacou as partes
tenras da árvore do cacau, com isso a produção em uma lavoura doente quase
chega a zero. Então, essa remissão da dívida dos cacauicultores que foram
geradas de 1995 para cá, ou seja, pós-vassoura-de-bruxa, tem que ter um apoio,
uma 'mão amiga' do governo para que seja feita uma anistia",
defendeu.
Conforme o projeto de Angelo Coronel, o Ministério da
Agricultura precisa fomentar o setor, com investimentos em tecnologia,
fortalecimento dos órgãos técnicos, como a própria Comissão Executiva do Plano
da Lavoura Cacaueira (Ceplac), além de abrir diálogo constante com os
produtores de cacau.
Na época, a tentativa de resposta à vassoura-de-bruxa foi
encabeçada pela Ceplac, mas não houve êxito. Segundo o senador, o objetivo
agora é dar um 'remédio' que cure a doença, e não mais um paliativo.
"Não adianta a gente apenas fortalecer a Ceplac, já que os
agricultores não têm como chegar aos bancos, porque estão endividados. Eu não
quero o perdão de quem contraiu dívida ontem, eu quero a remissão de quem foi
atingido desde 95, quando a Ceplac introduziu o programa de recuperação e não
foi à frente - pelo contrário, piorou a situação", pontuou.
Com o perdão das dívidas, Coronel acredita que será aberto um
espaço para que os bancos possam emprestar novos recursos aos produtores.
"E se tiver uma Ceplac forte, você vai ter novas espécies
de cacau e o controle de pragas com mais eficiência. Uma renovação da lavoura
cacaueira, trazendo inclusive tecnologia de fora, em que o controle de pragas
já é sucesso. Com o projeto, pedimos a anistia dessa dívida. E quando o
agricultor começar a tomar novos financiamentos para poder aplicar na sua
lavoura, vai aumentar a produção e consequentemente aumentar a arrecadação de
impostos. Então, o governo dá a 'mão amiga' hoje, mas vai colher no futuro
esses impostos oriundos da elevação da produção do cacau brasileiro",
ressaltou.
Cacauicultores elogiam iniciativa
A iniciativa do senador é bem vista pelos produtores, conforme
revelou a presidente da Associação Nacional dos Produtores de Cacau (ANPC),
Vanuza Lima Barroso. De acordo com ela, o PL vai promover a anistia sobre uma
dívida "injusta" e "ilegal".
"Nós temos, na Bahia, quase 100 municípios produtores de
cacau. Então, imagina esses produtores espalhados por esses municípios. Imagina
o estrago que foi feito lá atrás e que traz consequências, até hoje, nas
regiões produtoras de cacau. Muita violência, muito êxodo rural, as cidades se
tornaram favelas, muita pobreza, muita diminuição de emprego. Isso tudo foi de
acordo com o problema da vassoura-de-bruxa. Então, com toda certeza, haverá aí
um efeito de justiça com esse projeto de lei. Que nada mais justo do que
anistiar os produtores de cacau, devedores que não conseguiram pagar este
débito", afirmou.
Para Vanuza,
PL terá "efeito de justiça" para os produtores | Foto: Arquivo
Pessoal
Ao falar sobre a praga que assolou as plantações, Vanuza lembrou
que os órgãos não estavam preparados para enfrentar a vassoura-de-bruxa.
"Não tinha técnica e não tinha antídoto para se combater.
Na verdade, até hoje não tem. Não existe ainda um fungicida que a gente coloca
para combater. Mas o que existe hoje? Hoje, nós aprendemos a conviver com ela
[vassoura-de-bruxa]. Nós sabemos fazer um manejo adequado. Hoje nós
conseguimos, através da Ceplac, clones que são resistentes à vassoura-de-bruxa.
E naquela época, não existia", explicou.
Em função disso, o pacote tecnológico lançado na época não foi
eficaz contra a vassoura-de-bruxa. Esta questão, aliada aos empréstimos
solicitados pelos produtores na tentativa de combater a praga, foram
responsáveis por causar problemas aos cacauicultores.
"O produtor de cacau, além de estar com a
vassoura-de-bruxa, que ele não sabia tratar, ainda foi obrigado a pegar um
empréstimo para combater uma doença que não era de responsabilidade dele, era
uma doença exótica, uma doença que deveria ser combatida pelo Estado
brasileiro, pelo governo federal da época. E esse pacote tecnológico não
funcionou. E aí vêm as dívidas, vem o endividamento bancário, vem a falta de
crédito, vem toda uma problemática", pontuou.
Por conta deste quadro, a presidente da ANPC acredita que o PL
de Coronel permitirá que os produtores possam "tocar a vida"
novamente, inclusive, com a possibilidade de investir em suas propriedades e
lavouras.
"E quem não quiser vai vender. E com isso, a economia de
toda uma região vai se mobilizar, vai crescer e vai andar, afinal de contas
ninguém vai pagar essa dívida. Tudo isso já está ajuizado, mas com a Justiça
muito lenta, está lá em primeira, segunda, terceira instâncias, alguns
processos mais adiantados, mas está todo mundo na Justiça ainda, e já se
passaram três décadas praticamente. Esse PL é tudo que a região precisa para
poder se desenvolver, poder gerar empregos, gerar renda, para poder diminuir a
violência - é uma região extremamente violenta - e fazer justiça com o produtor
de cacau. Muitos deles já morreram, hoje não tem mais esses débitos, mas estão
na mão dos filhos", pontuou.