divulgação (Foto: Reprodução)
Provas da
Faroeste são compartilhadas com TCE por irregularidades em licitação no TJ-BA
O ministro Og
Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), vai compartilhar provas
obtidas na Operação Faroeste com o Tribunal de Contas do Estado da Bahia
(TCE-BA). As provas da Ação Penal 940, a primeira originada após a deflagração
da operação, foram requisitadas pelo TCE diante de indícios de irregularidades
em licitações no ano de 2017, quando o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) era
presidido pela desembargadora Maria do Socorro, investigada pelo Ministério
Público Federal (MPF) e Polícia Federal.
O compartilhamento das provas teve aval do MPF
por haver elementos que permitirão o conhecimento se houve irregularidades
administrativas durante a gestão da desembargadora. Por conta dos indícios de
irregularidades, até este ano de 2022, as contas do TJ-BA referentes ao ano de
2017 ainda não foram aprovadas. Os pareceres indicam a possibilidade de
aprovação com ressalvas. Atualmente, o processo de prestação de contas do TCE
está suspenso. O relator é o conselheiro Antônio Honorato.
IRREGULARIDADES
O TCE realizou inspeção in loco no TJ-BA no
início do ano de 2018 para coletar informações que permitiram a seleção das
áreas a serem auditadas, com vistas à verificação da regularidade da execução
orçamentária, financeira e patrimonial; dos controles internos; e das
disposições legais para prestação de contas. Na época, o orçamento total do
TJ-BA era de R$ 2,4 bilhões, sendo 78% empenhados para despesa com pessoal.
Naquele ano, o TJ-BA realizou 149
procedimentos licitatórios, sendo nove concorrências, 11 tomadas de preços, 116
pregões e 133 convites, que totalizaram R$ 260,2 milhões. Em termos de
contratações diretas, foram concluídas 4.399 com dispensa de licitação, sendo
4.338 de pequeno valor. Sobre as inexigibilidades, foram concluídas 65,
totalizando empenho de R$ 28,1 milhões.
Após a auditoria, foram encontradas
divergências dos quantitativos de dispensas e inexigibilidades apresentados na
prestação de contas, como ausência de avaliação quanto à gestão orçamentária do
TJ-BA, observando aspectos da eficácia, eficiência, economia e efetividade.
Foram relatadas ainda inobservâncias dos limites legais de acréscimos nas
alterações contratuais. O TJ havia indicado que os valores aditados eram
referentes a três contratos. que estariam dentro do limite legal, de 25% para
obras de construção e 50% para reformas, como previsto pela Lei nº 8.666/1993.
Entretanto, segundo o TCE, ficou evidente que os valores foram superiores ao
limite legal.
A principal irregularidade foi constatada no Pregão
Eletrônico nº 085/2017 para formar uma ata de registro de preço para
contratação de Sistema Integrado de Segurança (SIS), no valor de R$ 37,3
milhões, sem realização de estudos e análises preliminares para embasar o Termo
de Referência do edital. Para o TCE, não foram apresentados elementos
essenciais requeridos na fase interna da licitação, o que tornaria a
contratação irregular.
A auditoria do TCE constatou um
direcionamento da licitação, e que a base do edital foi elaborada por oficiais
da Assistência Militar, com considerações específicas técnicas consideradas
mínimas para hardwares e softwares, inclusive com exigência de marca e de
declaração de solidariedade do fabricante, “sem qualquer respaldo ou fundamento
técnico, sem evidência de aderência à demanda efetiva, e sem a análise e
avaliação pela área técnica, Secretaria de Tecnologia, Informação e
Modernização (SETIM), indicando a restrição à competitividade e o
direcionamento da contratação”.
A auditoria observou que houve previsão de
pagamento total do contrato antes do cumprimento integral do objeto. O edital
previu o pagamento de R$ 20,9 milhões a partir do recebimento provisório dos
equipamentos, sem considerar a prestação de serviço, como instalação e
configuração de infraestrutura para implantação do SIS em todas as unidades do
tribunal. O ato se configurou para os auditores do TCE “como risco de não
adimplemento do contrato, e, consequente, prejuízo aos cofres públicos, ainda
mais, quando considerado o valor envolvido”.
Outra irregularidade apontada seria uma
“burla” ao orçamento público com o uso inadequado do Sistema de Registro de
Preço, através do procedimento licitatório na modalidade pregão para formação
de ata de registro de preço, quando, na verdade, se enquadrava como licitação
tipo técnica e preço. O TCE frisou que o procedimento teve como objetivo dar
celeridade à contratação, sem estudos técnicos prévios. Também acrescentou que
não houve pesquisa de mercado e que as bases dos valores utilizados na
licitação “estão eivadas de vícios”.
O TCE pontuou que o objeto contratado,
por abranger solução de Tecnologia da Informação e Comunicação, requer, sempre,
a avaliação de uma área técnica, com projeto detalhado, quando se considera a
complexidade dos itens especificados, como sistemas de cabeamento estruturado
até equipamentos como switches, responsáveis pela conexão dos dispositivos de
rede. O pregão chegou a ser questionado em um mandado de segurança no TCE para
que fosse declarado nulo, que ainda tramita no tribunal de contas. O contrato
foi firmado com a empresa Megatech Controls Comércio e Serviços, com pagamento
realizado no ano de 2018, já tendo sofrido um aditivo no valor de R$ 786 mil. A
auditoria indicou que havia propostas com preços menores na disputa, conforme
indicado na ata da sessão pública. Em defesa prévia, o Núcleo de Licitação do
TJ-BA informou que era impossível os preços das propostas serem parametrizados
com os registrados na Secretaria da Administração do Estado (Saeb).
Outra irregularidade observada foi em duas
dispensas de licitação para contratação de serviços de limpeza e conservação,
com fornecimento de materiais, nas unidades do TJ-BA, pelo período de quatro
meses.
A auditoria ainda detectou fragilidades
no acompanhamento e fiscalização de um contrato; inconsistências nas
demonstrações contábeis; fragilidade no controle patrimonial; demora na
nomeação de fiscais de contratos; inobservância dos limites legais de
acréscimos nas alterações contratuais; vedação à participação de Empresas
Consorciadas sem a devida motivação; entre outras.
O Ministério Público de Contas emitiu
um parecer pela aprovação das contas de 2017 com ressalvas pelas
irregularidades constatadas pela auditoria. O órgão opinou pela suspensão do
processo de contas até o julgamento da medida cautelar que versa sobre a
licitação da Megatech.
RECOMENDAÇÕES
A auditoria do TCE chegou a recomendar ao
TJ-BA que adotasse medidas para sanear as irregularidades apontadas, e
determinou que o tribunal, em licitações futuras, “se abstenha de firmar termos
aditivos acima dos limites definidos em lei, observando a jurisprudência atual
do TCU quanto à impossibilidade de compensação entre acréscimos e supressões”.
PREJUÍZO
Devido a licitação irregular do TJ-BA com a
empresa Megatech, a auditoria do TCE constatou que houve um prejuízo para os
cofres públicos no valor de R$ 635 mil por diferença nos preços praticados no
contrato, como detalhado a seguir:
a) Uma diferença, a maior, no preço
total de 10 unidades do Painel de Visualização, no valor de R$ 35.799,20, o
equivalente a 104,67%;
b) Uma diferença, a maior, no preço total de
05 unidades do Nobreak de 10 Kva, de R$ 457.420,50, o equivalente a 678,01%; e
c) Uma diferença, a maior, no preço total de
05 unidades de Switch Core, de R$ 142.435,65, o equivalente a 793,59%.
O TJ-BA, ao TCE, informou que o caso já
estava resolvido perante o órgão, “não existindo qualquer dúvida sobre a
regularidade dos atos realizados pelos departamentos técnicos do Tribunal de
Justiça do Estado da Bahia”. Entretanto, o TCE diz que a afirmação “não condiz
com o resultado das auditorias realizadas”.
Em 2018, a defesa da desembargadora Maria do
Socorro afirmou que os apontamentos da auditoria se constituíram como meras
ressalvas à plenitude das contas prestadas. A defesa afirmou que “as supostas
irregularidades foram enfrentadas de forma clara e objetiva no âmago daquele
processo, não existindo qualquer dúvida sobre a regularidade dos atos
realizados pelos departamentos técnicos do Tribunal de Justiça do Estado da
Bahia”.
A defesa asseverou que a Comissão de Segurança
do TJ-BA recomendou a abertura do processo licitatório em caráter de urgência
para para aquisição de equipamentos de segurança, em razão das Unidades do
Poder Judiciário Baiano estarem desprovidas de qualquer item de segurança tanto
na Capital quanto no interior, conforme despacho do Desembargador Presidente da
referida Comissão. Na época, a comissão era presidida pelo desembargador
Gesivaldo Britto.
A desembargadora Maria do Socorro, através de
sua advogada na época constituída, declarou que os prédios “estavam
comprovadamente desprotegidos”. Foi detalhado que o serviço de monitoramento
“consiste em captura de imagens e emissão de alertas de ocorrências de acordo
com a área dos prédios”. “O TJ-BA estava com uma necessidade de segurança e um
meio para resolver, e sob estas premissas elaborou o Termo de Referência”,
justificou. O termo teria sido elaborado a partir de um estudo de demanda, que
“está amplamente comprovado nos autos daquele processo”. A defesa afirma
que o termo de referência do pregão eletrônico é semelhante a outros processos
licitatórios desta natureza e que, por serem equipamentos fabricados em escala
para o mercado, “obedecem a padrões técnicos inclusive em suas fichas
descritivas, não havendo, data vênia, em momento algum indicativo de marca dos
produtos a serem contratados”. Foram contratados equipamentos como câmeras,
gravadores, monitores e sensores.
Em 2021, pelo fato da desembargadora ter
estado presa na época, a defesa pediu sobrestamento do processo de prestação de
contas, por estar privada de liberdade, em decorrência de decisão do ministro
Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ),r elator das ações penais
originadas na Operação Faroeste. Por conta disso, a defesa perante o TCE
estaria prejudicada. Houve pareceres favoráveis à suspensão da prestação de
contas até a soltura de Maria do Socorro.
Ao Bahia Notícias, o TJ-BA respondeu alguns
questionamentos sobre o processo de prestação de contas e o contrato com a
Megatech. O TJ afirma que sempre "presta todas as informações
solicitadas pela Corte de Contas em todas as auditorias realizadas", e que
disponibiliza em seu site institucional o andamento processual de cada Prestação
de Contas. Afirmou que sempre envida esforços para "cumprir os
apontamentos trazidos pela Corte de Contas desde o recebimento dos Relatórios
de Auditoria de modo a respeitar os Princípios Constitucionais bem como os
Princípios basilares da Administração Pública sempre com o objetivo finalístico
de maximizar a qualidade, a eficiência e a eficácia e amplitude do acesso à
Justiça para todos". O TJ ainda informou que o contrato com a Megatech já
foi encerrado, com todo pagamento realizado, e que o serviço foi completamente
efetuado.