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Ministério
Público tira código de ética da gaveta, mas descarta ampliar punições
A elaboração de um Código de Ética do Ministério Público, que passou a
ser discutida com mais força nas últimas semanas, é vista como uma
possibilidade de deixar claro o que é permitido e o que é vedado aos
integrantes do órgão. A proposta, porém, descarta novas punições.
O texto será apresentado por entidades de classe ao procurador-geral da
República, Augusto Aras, e espelha o que já existe no CNJ (Conselho Nacional de
Justiça), que indica, por exemplo, que juízes têm que ser imparciais,
transparentes e terem condutas íntegras.
No caso dos promotores e procuradores, as condutas que eles devem seguir
também serão listadas no regulamento, que passará pela aprovação do CNMP
(Conselho Nacional do Ministério Público).
As punições a quem se desviar dessas obrigações, no entanto, continuarão
previstas nas legislações federais e estaduais que definem a organização e as
atribuições de cada Ministério Público.
Na cúpula do CNMP, o tema é visto como redundante. Há uma opinião
interna de que o código só repetiria o que já existe na lei e que não trará
mudanças significativas para os julgamentos do órgão.
Mas a elaboração do texto tem o aval das principais associações que
representam integrantes do Ministério Público e também tem sido cobrado por
parlamentares, que o veem como simbólico.
A aprovação desse código se tornou um dos poucos pontos em comum entre
essas entidades de classe e os deputados que defendem a PEC (proposta de emenda
à Constituição) que aumenta a influência política no CNMP.
Antes da votação da PEC na Câmara dos Deputados, o Código de Ética era o
tópico que menos sofria resistência dos integrantes do Ministério Público. Era
também um dos temas mais levantados pelo deputado que articulou a proposta,
Paulo Teixeira (PT-SP).
"A falta da aprovação de um Código de Ética revela a resistência do
Ministério Público de ter um órgão de correição mais efetivo", disse
Teixeira.
"Estão levando mais tempo para elaborar esse Código de Ética do que
Beethoven levou para compor a Quinta Sinfonia", ironizou o deputado.
A PEC, porém, acabou derrubada em votação na quarta (20), mas o
presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e seus aliados vão tentar
reorganizar o apoio para ainda tentar aprovar a medida em uma segunda
tentativa.
Com isso, as entidades de classe do Ministério Público, contrárias à
PEC, decidiram se antecipar e anunciaram na quinta (21) que encaminharão nos
próximos dias uma proposta de Código de Ética a Aras, que também preside o
CNMP.
Elas afirmam que o texto servirá como uma cartilha de referência
nacional para todos os integrantes do Ministério Público.
Entre as associações que apresentarão a proposta estão a ANPR
(Associação Nacional dos Procuradores da República), a Conamp (que representa
associações estaduais) e o CNPG (Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais),
além das entidades que representam os Ministérios Público do Trabalho e o
Militar.
"O Código de Ética que o CNMP vai editar não vai criar uma punição
nova. Ela tem que se basear no que está nas próprias leis. O que ele vai fazer
é uma sistematização. Ele cria uma cartilha que deixa de uma forma organizada
as condutas que podem levar a uma punição", afirma Ubiratan Cazetta,
presidente da ANPR.
Manoel Murrieta, que preside o Conamp, afirma que as associações
perceberam que o código é "uma demanda do Congresso e de parte importante
da sociedade".
"A Conamp apoia uma iniciativa nesse sentido e possui uma proposta
que será apresentada para a classe. Esperamos discutir esse tema internamente e
com a sociedade nas próximas semanas", diz Murrieta.
Os Ministérios Públicos são regidos por uma legislação principal, a
chamada Lei Orgânica do Ministério Público, de 1993.
Mas, além dela, existem leis complementares para cada Ministério Público
estadual e para o Ministério Público da União (que inclui o Federal, o do
Trabalho e o Militar), que definem a organização e o estatuto desses órgãos.
Por isso, cada local define de forma diferente quais sanções serão
aplicadas a determinadas infrações de seus integrantes, e isso não deve mudar.
Um exemplo foi citado na sessão do CNMP que decidiu pela abertura de
processo administrativo disciplinar que pede demissão dos procuradores que
integravam a força-tarefa da Lava Jato do Rio.
A acusação é a de que eles supostamente violaram o sigilo de
investigação sobre pagamento de propina na construção de Angra 3. Em seu voto,
que foi contrário à abertura do processo, o conselheiro Silvio Amorim Júnior
explicou a confusão.
Ele indicou a "discrepância às sanções disciplinares relacionadas à
violação de sigilo" em todo o país. Citou o MPU e cada um dos estados, que
aplicam punições que vão das mais leves, como censura e advertência, até mais
graves, como suspensão e demissão.
"Causa espécie esse diferente tratamento entre as leis orgânicas dado
o caráter unitário e nacional que possui o Ministério Público", afirmou
Amorim Júnior. "De toda forma, a maioria das leis orgânicas estabelece a
penalidade de suspensão para infração disciplinar de violação de sigilo."
As discussões sobre o Código de Ética ganharam força em 2019, quando
dois conselheiros do próprio CNMP apresentaram um anteprojeto sobre o tema. Na
justificativa, afirmavam que sua formulação ia "em direção ao aumento da
confiança depositada pela sociedade na instituição que zela pela promoção da
Justiça".
Esse anteprojeto, no entanto, aguarda em instâncias internas do CNMP
desde então. Atualmente está na Ouvidoria do órgão.
A própria PGR também já publicou, por meio de portaria de 2017, o seu
próprio Código de Ética e Conduta. A norma, no entanto, vale apenas para
servidores, e não para procuradores.
Além do CNMP, promotores e procuradores também são fiscalizados pelas
corregedorias dos seus próprios órgãos.