divulgação (Foto: Paula Fróes/ GOVBA)
Governos
estaduais reduzem gastos com educação apesar de aumento de receita
Governos estaduais têm segurado recursos disponíveis para a educação,
apesar do aumento de suas receitas e da necessidade de investimentos para a
reabertura das escolas, de acordo com um novo estudo sobre os gastos dos
estados durante a pandemia do coronavírus.
O levantamento sugere que a maioria dos governos estaduais deixou a
educação em segundo plano, aproveitando o período de suspensão das aulas
presenciais para economizar o dinheiro em caixa em vez de usá-lo para reformar
escolas e se preparar para receber os alunos de volta neste ano.
"Não houve prioridade para a educação, apesar dos desafios criados
pela pandemia", diz a economista Úrsula Peres, da Universidade de São
Paulo, coordenadora do grupo que fez o estudo, ligado à Rede de Pesquisa
Solidária. "Falta coordenação nacional e planejamento das ações dos
estados."
Segundo o trabalho, as despesas com educação caíram 6,4% no primeiro
semestre de 2020, em comparação com o primeiro semestre de 2019, e voltaram a
diminuir no primeiro semestre deste ano, com queda de 1%. Desde 2019, a redução
foi de 7,4% em termos reais, já descontada a inflação.
Alagoas, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Sergipe foram os
estados em que as despesas com educação mais encolheram nesse período, conforme
o levantamento. Somente nove estados aumentaram gastos na área, entre eles
Ceará, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Santa Catarina.
Recursos repassados pelo governo federal no ano passado permitiram que
os estados compensassem as perdas de arrecadação que sofreram com a crise
econômica causada pela primeira onda da Covid-19. Neste ano, suas receitas
aumentaram com a alta dos combustíveis e das contas de luz.
Os pesquisadores calculam que as receitas dos estados e do Distrito
Federal cresceram 10% em termos reais no primeiro semestre deste ano, em
comparação com as obtidas no mesmo período do ano passado. A arrecadação do
ICMS, principal tributo recolhido pelos estados, aumentou 19%.
Apesar da situação financeira favorável, os estados têm sido
conservadores na administração dos recursos. Os gastos com saúde aumentaram 16%
no primeiro semestre do ano passado, em comparação com igual período de 2019.
Neste ano, eles ficaram estáveis, com aumento de apenas 0,4%.
O levantamento considerou apenas as despesas liquidadas, ou seja,
aquelas em que houve efetivo desembolso de recursos para pagamento de pessoal,
fornecedores e outros itens. Em geral, os governos concentram no segundo
semestre do ano a execução das despesas previstas nos seus orçamentos.
"A falta de investimentos nas escolas pode comprometer a segurança
da retomada das atividades presenciais e dificulta a recuperação do atraso de
aprendizado ocorrido durante a pandemia", afirma Peres. "Isso tende a
agravar os problemas decorrentes da paralisação das aulas no ano passado."
Segundo o Censo Escolar de 2020, não há banheiros em 6% das escolas da
rede estadual do país e falta conexão de banda larga com a internet em 24%.
Alguns estados em que a redução das despesas foi maior também figuram entre os
que têm infraestrutura mais precária, notam os pesquisadores.
Com a retomada das aulas presenciais neste semestre, vários governadores
anunciaram medidas para trazer de volta estudantes que se afastaram das escolas
no auge da pandemia e fornecer computadores e chips de celular a professores e
alunos que não conseguiram participar de atividades remotas.
Mas nem sempre essas iniciativas têm sido acompanhadas de recursos
adicionais, afirmam os pesquisadores. Além disso, dificuldades burocráticas e a
recente edição de uma nova Lei de Licitações têm sido apontadas pelos
administradores como razão para atrasos na contratação de obras e serviços.
Em São Paulo, as despesas com educação sofreram redução de 6,4% desde o
início da pandemia. O governo estadual anunciou que destinará R$ 1,2 bilhão a
um programa que repassa recursos diretamente às escolas neste e no próximo ano,
mas o valor é inferior ao distribuído nos últimos anos.
Os autores do estudo calculam que, em 2019 e 2020, o governo paulista
enviou por meio desse programa R$ 1,7 bilhão para as escolas, em valores
corrigidos pela inflação. Neste ano, foram distribuídos R$ 343 milhões até 30
de setembro, o equivalente a 28% do total de recursos prometidos.
"As escolas que receberem esse dinheiro nos últimos meses do ano
terão dificuldades para gastar com a agilidade necessária", diz Fabio
Pereira, pesquisador que participou do estudo. "O repasse desses recursos
alivia pressões políticas, mas pode não alcançar os resultados almejados."
A Constituição Federal determina que os estados apliquem em educação no
mínimo 25% das suas receitas com impostos. Com a redução das despesas durante a
pandemia, muitos estados terão dificuldades para cumprir a exigência e poderão
ter problemas com os auditores dos tribunais de contas.
Para evitar que isso aconteça, o Senado aprovou na semana passada uma
emenda constitucional que isenta estados e municípios e permite que compensem a
diferença até 2023. A mudança ainda precisa ser aprovada em dois turnos pela
Câmara dos Deputados para ser promulgada e entrar em vigor.