Divulgação (Foto: Reprodução)
Casamento
com ritual umbandista em igreja de Salvador gera polêmica nas redes sociais
Arquidiocese classificou ato como "inadequado";
pós-doutor em Antropologia citou falta de diálogo
Um casamento realizado no último sábado (4), na Igreja de Santa
Teresa, no Museu de Arte Sacra, em Salvador, tem gerado polêmica nas redes
sociais. Isso porque a cerimônia que seguiu o "rito litúrgico
católico", conforme a Arquidiocese de Salvador, foi marcada por cantos,
orações e danças do culto afro dentro da igreja.
Em nota publicada nesta segunda-feira (6), a Arquidiocese
informou que o episódio se deu em função "da proximidade dos noivos com a
comunidade umbandista", e por isso, "algumas pessoas resolveram
prestar uma homenagem ao casal com cantos e orações do culto afro". A nota
indica ainda, que a homenagem se deu "antes do rito católico", e
reconhece que a homenagem "não era adequada para o espaço litúrgico".
A nota da Arquidiocese também fala sobre o cônego Lázaro Muniz,
que assistiu à cerimônia do casamento. Conforme o texto, o cônego não havia
sido comunicado, e portanto, não tinha dado "permissão para tais
incursões". A Arquidiocese indica ainda que o sacerdote "advertiu o
casal e alertou os convidados com relação ao fato, em vista de se evitarem
outras atitudes inconvenientes".
Foi informado também que as pessoas implicadas diretamente na
cerimônia foram "comunicadas e se manifestaram com pedido de desculpas por
terem realizado tais atos dentro de um templo católico".
A Arquidiocese afirmou que existem "publicações circulando
nas mídias sociais que não revelam o verdadeiro teor da celebração realizada,
seguindo o estrito Ritual de Matrimônio, na fórmula 'sem missa'".
Por fim, a nota defende a importância do "diálogo
inter-religioso" e ressalta que ele sempre deve ser "marcado pelas
normas canônicas e as orientações pastorais vigentes, no respeito aos diversos
segmentos religiosos".
Houve falta de diálogo, acredita pós-doutor em Antropologia
Ao Portal M!, o
pós-doutor em Antropologia, professor associado da Universidade Federal da
Bahia (UFBA) e babalorixá da Casa do Rei e Senhor das Alturas, Vilson Caetano,
disse acreditar que houve falta de diálogo nos preparativos para a celebração.
Ele também ressaltou não existir "novidade" no uso de elementos da
cultura africana em cerimônias religiosas.
Vilson Caetano é
pós-doutor em Antropologia | Foto: Reprodução/Instagram
"Não é novidade a presença de, por exemplo, atabaques,
cânticos das religiões de matriz africanas, a utilização de alguns elementos
das culturas africanas. Esses elementos se tornaram quase que obrigatórios para
poder pensar uma igreja latino-americana mais enculturada, uma igreja que
dialogasse com os elementos de matriz africana. Então, qual a diferença? A
primeira diferença que observo é a falta de diálogo, a falta de acerto,
tratando de que você iria trazer elementos de outra ritualística para uma
religião que tem, de fato, toda uma ritualística própria", apontou o
antropólogo.
Outro aspecto que seria responsável por causar um
"estranhamento", segundo Vilson Caetano, é a maneira como os orixás
foram representados. "Isso é algo que vai de encontro a tudo que nós, de
algumas tradições, ao longo do tempo, dizemos: 'vamos respeitar o nosso
sagrado, não vamos banalizar o nosso sagrado'. O nosso sagrado não pode ser
apresentado de maneira espetaculosa. Então, eu acho que você tem dois
elementos: a falta de diálogo e a apresentação de um elemento que é fundamental
nos cultos afro-brasileiros de maneira meramente ilustrativa".
Caetano também defendeu que, se a intenção era realizar
uma celebração aos "moldes de uma religião afro-brasileira", a
exemplo da umbanda, isso deveria ser feito em um centro umbandista.
"O centro de umbanda já tem a sua ritualística própria.
Então, o grande problema é quando você tenta transferir alguns elementos
simbólicos de outras religiões sem uma preparação prévia, e da maneira como foi
realizada, para outro modelo religioso. Então, talvez seja isso, somado ao
preconceito das pessoas, somado ao racismo que existe em torno de algumas
colocações, talvez isso nos ajude a pensar no fato que ocorreu", pontuou.